quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O jornalismo mundo-cão e medieval


Gravura antiga registra empalamento: sites e TVs locais fazem o mesmo


Na época medieval, quando o valor do homem como ser humano chegou aos mais baixos níveis, as guerras costumavam deixar centenas de milhares de mortos amontoados como se fossem apenas lixo descartado em um aterro sanitário.

Dependendo da crueldade do soberano vitorioso da contenda, eram aplicados alguns requintes às vítimas: o corte das cabeças dos cadáveres e sua exibição como troféus; o empalamento dos vencidos, que depois de mortos passavam dias a apodrecer além dos muros dos castelos, para deleite do rei e horror e medo da população...

Ainda ontem li em um site local chamada de matéria sobre a descoberta de um cadáver em uma vila da cidade. Aparentemente, dizia o texto, tratava-se de um senhor que havia sido atropelado e deixado para morrer. Tudo bem até aí, não fosse a questão do repórter em exibir as fotos da ossada, mas com o alerta “imagens fortes”.

Esse é o velho e nada bom “jornalismo mundo cão” que vez por outra (ou não!) toma de assalto nosso meios de comunicação, ávido na busca de audiência. É aquele velho conhecido, embora desprestigiado, que nos impressos faz pingar sangue das páginas e na televisão nos embrulha o estômago com closes de vísceras humanas, corpos degolados, cabeças rolando, mãos e pés decepados, cadáveres em putrefação, entre outras imagens que nos relembram contra a nossa vontade o quanto vivemos em perigo. Funciona?

Esse jornalismo visceral – é um trocadilho mesmo – já fez a cabeça de muitos comunicadores no Brasil e no Piauí e foi perdendo espaço na grande mídia justamente porque causa asco e em nada acrescenta de informação para o público.

Por enquanto, neste Estado, ainda há muitos colegas que não conseguem largar a brincadeira das escolas infantis americanas de contar e mostrar. Continuam a seguir a máxima de que uma imagem vale mais que mil palavras.

Pergunto a você: no que a visualização de uma foto ou a imagem de um corpo em putrefação acrescenta no seu conhecimento do fato? É mesmo necessário exibir o álbum de fotografias ou o DVD dos melhores momentos do IML? Faz diferença?

Dia desses, o programa Interferência, do qual sou produtor, levou o tema a debate por conta da reclamação de uma telespectadora: ela se sentiu incomodada com “imagens fortes” – lembram? - em uma matéria de TV. O convidado do debate, jornalista Pedro Alcântara, criticou o fato de forma sucinta: a televisão do Piauí nesse ponto precisa crescer. Alguns sites também, acrescento. Se não conseguirem crescer, pelo menos que percam o hábito doentio dos reis cruéis da era medieval. Carne humana só é bacana na música do Arrigo Barnabé.

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